No artigo anterior tentamos responder à pergunta “Quando o Tietê vai melhorar?”
E a conclusão é que nos próximos 10 anos isso pode ocorrer se as medidas e projetos atuais seguirem o seu curso normal.
A principal consideração é que as cidades tratem seus esgotos de acordo com a legislação vigente.
A legislação atual permite o lançamento do esgoto tratado nos corpos receptores, rios, de acordo com o artigo 18 do decreto estadual 8.468 de 8 de setembro de 1976 e a resolução 430 do CONAMA, Conselho Nacional do Meio Ambiente.
A legislação foi atualizada em 2009 através do decreto estadual 54.487 de 26 de junho de 2009, porém, somente a aspectos de poluição do ar, especificamente sobre emissões veiculares.
Mesmo sendo um decreto com mais de 40 anos tem aspectos bem atuais, no que tange aos aspectos da poluição das águas.
Porém com a evolução da sociedade, crescimento demográfico e da cobertura de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto e drenagem urbana, visualizamos que existe espaço para a sua atualização, aperfeiçoamento com a finalidade de melhoria da qualidade dos rios paulistas.
Seguindo a legislação atual a carga orgânica deverá estar controlada no Rio Tietê nos próximos anos. Porém, além da carga orgânica, existem alguns outros vilões escondidos no esgoto que não têm padrões de lançamento bem definidos. Vamos aqui falar de dois deles; Nitrogênio, N e Fósforo, P.
Como engenheiros devemos pensar e planejar as ações futuras para resolver problemas.
Por isso falar em controlar Nitrogênio e Fósforo é adiantar em 10 anos melhorias de um problema que já existe e que é mascarado por outro maior que é a falta de saneamento atual.
Porque as ETEs (Estações de Tratamento de Esgoto) deveriam tratar Nitrogênio e Fósforo e a legislação ser mais restritiva?
Porque eles são elementos químicos, macronutrientes, ou seja, fertilizantes. Vide a famosa sigla NPK (N-Nitrogênio, P-fósforo e K-potássio).
O excesso de Nitrogênio e Fósforo na saída das estações, funciona como um potente adubo que causa a proliferação de algas e cianobactérias e estas consomem o oxigênio dissolvido existente no rio.
O que demonstra a degradação dos rios é o aumento do processo da eutrofização que é o enriquecimento do sistema aquático devido ao aumento de nutrientes principalmente o N e P que proporcionam a proliferação e afloração de cianobactérias que consomem o oxigênio dissolvido na água causando a morte de outras espécies como os peixes por exemplo.
Então todo o esforço para tratar o esgoto diminuindo a carga orgânica e mantendo um residual de oxigênio dissolvido pode ir por “água abaixo”, sendo consumido por algas e cianobactérias que tem condição propicia de vida: água, alimento e adubo.
Primeiramente vamos analisar o Nitrogênio que é o mais abundante e de mais fácil solução técnica.
E de onde vem basicamente o Nitrogênio?
No Brasil, de todos nós, mais de 210 milhões de habitantes. O Nitrogênio compõe 70% do ar e nós seres humanos o eliminamos através da urina que vai para o esgoto. Outra importante fonte de geração de Nitrogênio no esgoto e cursos d’água, é o lixo urbano que produzimos.
O lixo urbano vai, no Estado de São Paulo, majoritariamente para aterros sanitários controlados.
Nos aterros escoa um resíduo líquido, percolado, chamado de chorume, altamente concentrado em Nitrogênio nas formas de Amônia, Nitrogênio Amoniacal e Nitratos.
Uma das práticas mais utilizadas de tratamento deste chorume é o tratamento em ETEs de esgoto doméstico convencionais das cidades. Como é a ETE Barueri da Sabesp que acaba recebendo através de empresa de recolhimento e tratamento de efluentes industriais, o chorume de um dos maiores aterros da grande São Paulo. O aterro Pedreira em Guarulhos-SP.
Na nossa região o chorume de Cabreúva, Itu, Indaiatuba e Salto, após um processo de pré-condicionamento são tratados na ETE- Santa Isabel em Salto.
As tecnologias atuais mais difundidas nas ETEs são de tratamentos biológicos, anaeróbicos e aeróbicos que na forma como são operados tem baixa eficiência na remoção do Nitrogênio, o que causa um lançamento muito alto dele nos rios.
Sobre o fósforo, no esgoto ele se apresenta como fosfato, tanto na forma orgânica como inorgânica. Na média podemos encontrar 40% na forma orgânica e 60% na forma inorgânica.
A parcela inorgânica do fósforo vem principalmente dos detergentes utilizados pela população que vem evoluindo devido ao aumento do consumo e desenvolvimento das regiões urbanas. Muitos países desenvolvidos restringem ou mesmo proíbem utilização de detergentes fosfatados.
Então é o momento de darmos um passo maior no sentido de restringir o lançamento Nitrogênio e Fósforo.
Uma mudança na legislação para o controle destes parâmetros permitiria uma melhoria substancial na qualidade dos rios.
As Estações de Tratamento de Esgoto podem ser modernizadas e ou adaptadas para uma mais eficiente remoção de Nitrogênio e Fósforo.
A Nitrificação e desnitrificação é um processo bem conhecido que transforma as formas de nitrogênio amoniacal em nitratos, nitritos e finalmente em nitrogênio gasoso inerte que retorna a atmosfera. São tecnologias amplamente difundidas e que com um planejamento de engenharia e uma alocação escalonada de recursos podem permitir um salto substancial de qualidade nos nossos rios.
Uma das formas de remoção do fosforo em uma ETE é a precipitação da estruvita (MgNH4PO4) pela adição de sais metálicos.
Além do ganho ambiental pode até haver um ganho econômico, pois a estruvita pode ser usada como matéria prima na fabricação de fertilizantes.
Concluindo:
O poder público e as empresas de tratamento de esgoto, podem fazer muito mais do que cumprir a legislação atual para melhorar a qualidade dos rios, especialmente do Rio Tietê. Adaptar suas ETEs para reduzir ao máximo a o lançamento de Nitrogênio e Fósforo
A legislação pode ser aperfeiçoada para restringir o lançamento destes nutrientes, tornando a vida aquática melhor.
Crédito imagem: Zardetto/Wikimedia Commons
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